lagarta chã

Daí a brisa forte e sadia que vem deste novo livro de Thássio Ferreira, muito felizmente chamado lagarta chã. Algo que responde ao mundo, mas anseia o que não se contenta na resposta – antes convoca, aponta, desdobra. O que temos aqui é, como nunca deixará de ser necessário, um encantamento múltiplo com o ponto mais chão, a coisa mais chã: das turbinas às lagartas, dos mucos às galáxias, passando pelas casas, as plantas, os poetas, os corpos, as parafernálias que fazem uma vida, muitas vidas. (Guilherme Gontijo Flores)

Daí a brisa forte e sadia que vem deste novo livro de Thássio Ferreira, muito felizmente chamado lagarta chã. Algo que responde ao mundo, mas anseia o que não se contenta na resposta – antes convoca, aponta, desdobra.

O que temos aqui é, como nunca deixará de ser necessário, um encantamento múltiplo com o ponto mais chão, a coisa mais chã: das turbinas às lagartas, dos mucos às galáxias, passando pelas casas, as plantas, os poetas, os corpos, as parafernálias que fazem uma vida, muitas vidas.

(Guilherme Gontijo Flores)

 

Um livro sobre o tempo. O tempo do autor de dizer o que precisa ser dito. O tempo de olhar para si e para os seus. De observar os ciclos para compreender que a vida se torna infinita no presente. A contagem do tempo pelas relações sexuais/afetivas efêmeras. Um livro sobre o fazer poético, porém mais do que isso, sobre a experiência do corpo com a linguagem.

Poesia e tempo são grandes aliados, principalmente quando se entende a primeira como resistência à barbárie, tão presente hoje. Em lagarta chã, Thássio busca na poesia desenganar a fragilidade da existência, dialogando com o presente e a memória, para afirmar o direito à vida.

(Ramon Nunes Mello)

 

O livro pode ser adquirido autografado diretamente com o autor, pelo email thassioescritor@gmail.com, ou no site da editora Patuá.

 

* poemas escolhidos *

 

chão

 

a casa é mais velha

que eu

não me interessa

a terra, a terra

é mais velha

 

sobre seu tempo

esvaído em tanto

cascas, verde-anil

sombras de ruídos

 

dói-me descobrir

gozando surpresa

: este meu chão

 

 

o/um poema [2]

 

o poema se arquiteta

em geometria da linguagem

movimento

feito fora substância

sem ânsia a inventar

sua própria cartilha

 

de química

 

gramática

 

e sentimento

 

 

carma 

 

nalguma vida

que se avizinhe

(se as houver)

 

voltar vaga

lume

 

no jardim da casa

onde a vó dançava

 

 

leituras contemporâneas

 

andei lendo a odisseia

depois de vencida a ilíada

 

mas cansei do rei de ítaca

 

quem mandou guerrear

por orgulho de macho ferido

 

fui ler o manual antifa

 

 

eu e tu

 

tu — tronco, carnaúba

muito ereto, dura

altivez contra o vento

 

não te dobras, não vergas

tentativa de tudo

que nada penetra

 

eu — mordente saúva

sedenta e úmida

empinando bicicletas na língua

 

pra te inocular meu visgo

sem sucesso

 

 

ais veis

 

há vezes em que o verso

se declara límpido

: avião riscando o céu

notas de piano cruzando o silêncio

corte de faca nova

toda brilho e exatidão

 

há vezes em que os versos

— improviso e convulsão

dança espontânea sem amarras

de um corpo forte

todo tesão —

são frenesi de estímulos

possessão

 

i ais veis nenhé

(é) só zuêra, distração

da vida útil das palavras