Seis poemas Revista Ruído Manifesto

Publicados com editoria de Divanize Carbonieri na revista Ruído Manifesto.

antevéspera

       (para Fernanda Nader Garavini)

 

antevéspera de eleição:

caminho nos jardins

do museu perto à casa

 

ainda há jardins

museus

ainda tenho pernas

embora casa já pareça

palavra (ideia) estranha

deslocada

em ruínas

 

uma criança

atrás de uma samambaia

escondida

(frágil proteção):

 

há medo

no rosto dela

 

estamos brincando

(estamos?)

de pique-esconde

por favor

não me denuncia

 

denunciar: estranha palavra

na boca de uma criança

acho que aprendeu na tv

tantos escândalos:

fulano furtou um boi

enquanto boiadas passam

 

sorrio, ocultando

meu próprio medo:

conta comigo

não vou te denunciar

 

 

(sem título)

 

o primeiro verso

deste poema

em minha cabeça

não seria

“o primeiro verso”

mas sim

“o jogo virou”

antes que

a antipoesia

de onde

escrevo imerso

me cuspisse

à cara

que não há mais

jogo, o que

pressupõe regras

como a física

pressupõe regras

–– não há mais física

como a linguagem

para ser compreendida

minimamente

pressupõe regras

mínimas

–– não há mais linguagem

(sendo minimamente

compreendida)

 

a existência

 

(razoável

/

compreensível)

 

foi abolida

 

 

desejo

(para o P.T. — Peterson Thiago)

 

desejo de me convidar

pro teu peito

afundar nos pelos

como areia de aspereza

líquida em meio

a tanta areia

que cega e fere

esses dias

 

tantos ódios

em longas horas

que já duram meses

e amores doentios

cevados como porcos

como o trator pensa

amar a terra

que revolve

por trazê-la

pra junto de si

(esfarelada)

como a cerca

(farpada) acha

que ama o bem

qualquer que envolve

tentando privá-lo

do mundo

dos outros

como se isso

pudesse chamar

amor:

incalcançar do mundo

de existir

como se apenas

a ira e o fogo

do que um dia

foi amor

do que um dia

se chamou

amor

fosse o que

sobrasse

transbordasse

pelos dias

nos peitos

tão areia

demais de quente

diferente (pra caralho)

da morna areia

líquida

do peito teu:

 

desejo

 

mas os teus gestos

quando em pé

desenhando fintas

às minhas entregas

tão diretas

teus gestos em árabe

tuas palavras em libras

em meio aos tratores

e arames farpados

de tantas cercas

desviam minhas mãos

 

e os dias seguem

com seus amores doentios

e meus desejos reprimidos:

 

não, não é melhor

assim

mas é assim

que tem sido

 

 

Poema tirado de uma notícia de portal

 

Hoje a poesia morreu.

 

O poema tirado

de uma notícia de jornal

que no caso

tiro dos bytes do portal

de notícias

(nesses tempos de golpes

internet e poesia

como resistência mais

que literatura

— porque é preciso)

 

é poema oco

anunciando

que Jéssica Monteiro

de vinte e quatro anos

foi detida por tráfico

portando noventa

gramas de maconha

— algo como um

carnaval e meio

de vários usuários

não negros

nem pobres —

 

foi escoltada ao hospital

deu à luz o Henrico

foi escoltada de volta

(— a poesia morre sempre

um pouco quando

precisamos usar

palavras como

es colta da

num poema —)

e se encontra

com seu bebê

em uma cela

suja (como todas)

de dois metros quadrados

 

a pedido de uma promotora

grávida

(!)

 

 

— Publicados com editoria de Divanize Carbonieri. Para ler completo, acesse Ruído Manifesto.

Livros

lagarta chã

Daí a brisa forte e sadia que vem deste novo livro de Thássio Ferreira, muito felizmente chamado lagarta chã. Algo que responde ao mundo, mas anseia o que não se contenta na resposta – antes convoca, aponta, desdobra.

O que temos aqui é, como nunca deixará de ser necessário, um encantamento múltiplo com o ponto mais chão, a coisa mais chã: das turbinas às lagartas, dos mucos às galáxias, passando pelas casas, as plantas, os poetas, os corpos, as parafernálias que fazem uma vida, muitas vidas.

(Guilherme Gontijo Flores)

Leia mais.

Nunca estivemos no Kansas

Vinte e dois contos que transitam por diversos cenários, relações humanas e estruturas narrativas, construindo uma cartografia de arestas e descaminhos, desde um idílio qualquer onde nunca estivemos — individual e coletivamente — até o presente e além.

Parte dos contos reunidos angariou prêmios como Off-Flip (2019) e Prêmio Cidade de Manaus (2020), foi finalista do Prêmio Sesc (2017) e publicada em veículos como Jornal Rascunho, Revista Garupa e Vício Velho.

Leia mais.

agora (depois)

Em seu terceiro livro, Thássio Ferreira desnovela a linha do tempo de uma história de amor, de trás para frente, em 52 poemas organizados em duas partes: um “agora (depois)” instalado com a separação; e o “agora” anterior, do início do relacionamento até sua crise. Dividindo esses dois tempos, um retrato em prosa do momento fatal em que o barco se desamarra do cais.

Leia mais.

Itinerários

Itinerários, de Thássio Ferreira, vencedor do I Concurso Literário Editora UFPR, em sua linguagem agradável, técnica refinada no uso de rimas internas e externas, ritmos cadenciados, ecos verbais e temáticos, bem como suas aliterações e assonâncias sutis, promovem uma poesia impactante que envolve e encanta.

Leia mais.