Alguma coisa em mim que eu não entendo

eu não sei como começar. nem como seguir. mas sigo. (e você, como faz?)

Alguma coisa em mim que eu não entendo

 

eu não sei como começar. nem como seguir.

 

mas sigo.

 

(e você, como faz?)

 

não lembro quando ou porque comecei a escrever. talvez por algum desequilíbrio hormonal, à beira da puberdade, naquele século tão longínquo que nem internet havia. talvez, ainda, eu nunca tenha me reequilibrado, e essa precariedade também (des)explique meu pasmo em seguir — mesmo sem saber porque sigo (escrevendo escrevendo escrevendo).

 

porque eu sigo. por que eu sigo?

 

(você lembra por que começou a ler este texto? e por que segue? não minta.) também não lembro quando ou como eu me apaixonei pela primeira vez. minhas faltas de memória talvez sejam parecidas, nessa dificuldade esquisita de registrar os detalhes justamente de eventos tão importantes ao meu afeto.

 

(você lembra a primeira vez em que pensou “eu queria que este momento durasse pra sempre”? não minta.)

 

e no entanto, não paro de seguir — tentando desenhar novas lembranças e esquecimentos, escrevendo novos pasmos e incompreensões na carne luminosa, cinzenta, chuvosa (tudoaomesmotempo) dos dias. por quê? porque sim. porque a opção é a morte, e não quero morrer. prefiro a imensidão (doída, mas prenhe de beleza e gozo) que é construir os significados com os pés em movimento, o sangue quente, o olhar atento. o amor como um oceano, muito maior que uma ponte.

 

(e você, como tem amado, pelas esquinas e pistas de dança, nas filas de banco e redemoinhos internéticos? tem sido água e correnteza, a cambalhotar na falta de chão? ou tem-se feito engenharia exata, armada na dureza do ferro, do concreto? não minta.)

 

eu não lembro, com a sinceridade quase dos idiotas, qual desses é meu mais velho vício: amar ou escrever. mas sigo. sigo.

 

e sigo.

 

embora também não lembre como ou quando exatamente primeiro escrevi aqui, neste não-onde virtual em que você me lê, graças a um bocadinho de amor que alguém teve por algum outro texto meu que também não lembro qual, o que eu quero dizer agora, antes que me esqueça, antes que me esqueça!, é que seguirei um tempo escrevendo escrevendo escrevendo, de quinze em quinze dias (talvez), (sobre) histórias que não lembro, sobre amores que não entendo. por quê? porque sim.

 

(e você, seguirá me lendo? não minta.)

 

 

— coluna de estreia publicada em 04/2020 na Revista Vício Velho.

Livros

lagarta chã

Daí a brisa forte e sadia que vem deste novo livro de Thássio Ferreira, muito felizmente chamado lagarta chã. Algo que responde ao mundo, mas anseia o que não se contenta na resposta – antes convoca, aponta, desdobra.

O que temos aqui é, como nunca deixará de ser necessário, um encantamento múltiplo com o ponto mais chão, a coisa mais chã: das turbinas às lagartas, dos mucos às galáxias, passando pelas casas, as plantas, os poetas, os corpos, as parafernálias que fazem uma vida, muitas vidas.

(Guilherme Gontijo Flores)

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Nunca estivemos no Kansas

Vinte e dois contos que transitam por diversos cenários, relações humanas e estruturas narrativas, construindo uma cartografia de arestas e descaminhos, desde um idílio qualquer onde nunca estivemos — individual e coletivamente — até o presente e além.

Parte dos contos reunidos angariou prêmios como Off-Flip (2019) e Prêmio Cidade de Manaus (2020), foi finalista do Prêmio Sesc (2017) e publicada em veículos como Jornal Rascunho, Revista Garupa e Vício Velho.

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agora (depois)

Em seu terceiro livro, Thássio Ferreira desnovela a linha do tempo de uma história de amor, de trás para frente, em 52 poemas organizados em duas partes: um “agora (depois)” instalado com a separação; e o “agora” anterior, do início do relacionamento até sua crise. Dividindo esses dois tempos, um retrato em prosa do momento fatal em que o barco se desamarra do cais.

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Itinerários

Itinerários, de Thássio Ferreira, vencedor do I Concurso Literário Editora UFPR, em sua linguagem agradável, técnica refinada no uso de rimas internas e externas, ritmos cadenciados, ecos verbais e temáticos, bem como suas aliterações e assonâncias sutis, promovem uma poesia impactante que envolve e encanta.

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poemas-ponte (do isolamento pra fora)

Depois de algumas prosas pandêmicas e pequenas pulsações poéticas, quero erguer pontes, precariamente e a medo, entre esta alguma coisa em mim que não entendo — ainda mais aqui dentro, em tantos sentidos, durante este isolamento — e (vocês) lá fora:

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